01 março 2007

(a arte da fuga: fuga de contrapontos melódicos)






asa

eu não estaria a partir-me todo por dentro
se no enunciado do meu diário tu estivesses sobre um branco
que completasse este indizível. há correntes sobre este
impossível nomear,
assa
há inspirações que não podem estar numa receita ao jantar
há nocturnos felinos procurando fugas
e as partes restantes da humanidade.
asas
fico portanto nesta limpeza do rosto por te ter olhado
e bebo todas as cidadanias do teu inanimado verso
que de noite me encolhe e resguarda. terei uma legião inteira
à espera da tua volta
avisando-me do teu brusco chegar

e respirando sobre cada um dos teus clássicos intervalos.

estou tão contente por finalmente nenhum milímetro de ti
ser a régua dos meus blocos de notas.

não tenho na verdade horizontes de natal nem de princípio
muito menos de suficiente coragem. mas cumulo poemas
sem que te apercebas das alterações do clima
asas
e de toda a natureza.
asas
é assim que toda a independência dos objectos é literária
e que sobre a sua negação reside o incêndio
desta dupla resignação: tu tens vontade de poder
as
enquanto eu vou enchendo os campos de girassóis.
asas

3 comentários:

Anónimo disse...

A noite está a um passo de estourar e as estrelas não vão ter cinco ou seis vértices poéticos; montas-te na geometria encontrada nos vazios a que Euclides não chegou e queres catalogar-me na cauda de um cometa. A poesia está na massa se houver manjericão forte. Eu não tenho mais pretensões senão a minha solidão. À rede nem um peixe chega e quando tal acontece sou eu quem abre buracos e rasga liberdades.Os tempos não existem. Os nomes não são nada que se traga no bolso para lavar juntamente com os bolsos das camisas. O amor é muito mais do que táctil e serve-se antes da sobremesa. Bem temperado e sem enrolar os guardanapos timidadente, sem lhes dar nós que vêem os outros cantos da mesa.
Amanhã, a música espera-me à uma e meia para um almoço com um jovem amigo. E encontraremos certamente rumos de euforia e de bem-estar - R

Gabriel Mário Dia disse...

pois por agora é a tarde que está a umas horas de trazer para dentro os sopros enrolados sobre planícies desertas de verde e castanho. mais lá para o meio dos ponteiros da noite, quando até as corujas já não cantam, sussurros instantâneos vão cobrir as elipses para lhes dar uma forma. todo o contorno do vazio é uma elipse em pose de desejo que apenas pode desejar o desejável. a exterioridade é tremendamente insuficiente para que o prazer subsista enquanto repouso. valham-nos as geometrias encantatórias que num rasgo de tambores expulsam cá para fora tudo e mais alguma coisa. valham-nos as visões do medo para serem a armadura que num mundo branco tem sangue vermelho a mais. salomão devia ressuscitar. é que é possível reinar sem grandes guerras.

Anónimo disse...

Acontece ao desejo não ser capaz de se dividir entre o telhado de zinco fresco e a planície verde de rios suculentos da cor morna das romãs logo ao nascer do dia. O vermelho espaça-se por entre todas as elipses e cresce devagar em lentidão erótica, forte,instalando-se no tempo que rasga no meio de um prazer a que se sucumbe desmaiando. E todas as tonturas do vermelho se transformam em rios brancos disparados contra paredes caiadas de amor. E é bom. E é reconfortante. Nunca em demasia, nunca a faltar, nunca aa pensar nunca ou sempre, como as fases da lua. -R