23 agosto 2013

Das alvuras, ou “a melancolia das malas” (subtítulo emprestado de J. Cortázar)


















Fui atrás, por um dia ou dois,
(era Verão, como agora)
daquela cor bamboleante
que flutua numa nuvem encarnada.
O cair lunar, nesse dia ou dois,
foi para sacudir a palavra vaga e rastejante
da minha ténue espertina.
Voltei na sombra e no cansaço da vaga,
como na chegada a um ventre,
respirando-a com toda a força.
E entre a palavra azul da praia
repeti inúmero esse verbo à solta que é perguntar.
Roubei estâncias a um futuro da mão,
vestígios de textos incapaz de ler ou escrever.
Na procura
tudo é definitivamente lixo.

12 agosto 2013

Requerimento para existir II (ou a tomada de consciência de K., em Der Prozess)

















Ele pode compreender todas as coisas
mas isso não significa que as interprete
à luz das formas e dos escritos.
Um homem esperou até morrer,
e ele, enquanto morria num sulco achado nas pedras,
ainda sentiu horizontar alguém
numa janela em frente diante de si.

Saber que se vai morrer é diferente,
mesmo num qualquer sentido literário da peça.
Ao saber que iria morrer, como ele, isso tornou-o inocente,
e quem o levara à morte
mais não fez do que num oceano parado
levá-lo a pintar um quadro de cavalos iluminados.

Ele foi seco e obstinado sem razão de o haver ser,
e porém
todas as culpas recaem na liturgia das sombras,
paralelas desde o levantar da cama.

A tomada de consciência do Processo acontece
naquele pequeno sulco,
fora de todos os púlpitos. Não foi desistência,
muito menos astúcia.
Foi morrer como em casa e no trabalho,
a pena que diariamente lhe acontecia,
ausente de um descanso à espera.